Na vida cometemos erros e por
vezes fechamos os olhos para eles. Torcemos no íntimo que ninguém se lembre
deles, ou que ao menos não toquem no assunto de novo. É um desejo muito
particular de não ser questionado, não ter sua honra e imagem arranhadas. O
tempo passa, somos vitimas de piadinhas, ‘tiração’ de sarro. Sim, nossa imagem
ficou arranhada, da pior forma... não houve menção em assumir nada. As ondas
não marcam a areia definitivamente, mas vem e vão, podemos ver a linha que ela
faz a cada vinda. (...)
Havia um time de futebol que era
muito conhecido em seu país. Tinha história. Produziu grandes jogadores que se
tornaram ídolos em uma nação tão carente de exemplos. Mas carência de bons
exemplos também tinha refletia no tal time, eles o dilapidaram tanto quanto
puderam, tornando o grande Clube de futebol numa sombra desajeitada de seu
passado glorioso.
Viver de seu passado maravilhoso não foi
suficiente para mantê-lo em pé e ele sucumbiu ao ponto de em seu pior ano, não
ser mais contado entre os grandes. Sabemos ainda assim que em meio a uma crise
alguém pode se mostrar grande, portando-se com dignidade, enfrentando as
dificuldades. Não foi o caso, o grande time de futebol se achou digno de, por
meios escusos, permanecer entre os grandes. Conseguiu. Porém no ano seguinte,
foi tão mal que caiu novamente e continuou caindo e caindo. Já era contado
entre a terceira força do futebol de seu país, os dias de glória se foram.
Apesar dele ainda ser lembrado
como aquele que caiu e não aceitou a queda, usando de meios reprováveis para se
por de pé, veio o renascimento, pelo menos parecia... disputou em campo com a
terceira força e sagrou-se campeão. Parecia num rumo menos nebuloso, retornando
não apenas para a segunda força (possibilidades de primeira também), mas antes e
muito mais importante, para o caminho honroso e digno, do passo no tamanho das
próprias pernas, sendo tão bom como fosse possível, retirando orgulho disso. Mais
uma vez, não foi o caso. Ao invés desse famoso time ir para a segunda força,
outra vez de maneira escusa pulou diretamente para a primeira. Achava-se digno
de ser contado entre os grandes. É bem verdade que ele não foi o único time que
saltou dessa maneira, mas sua atitude era notória, estava marcado pelas
vergonhas anteriores.
Enfim, assim ficou. Todos
fecharam os olhos, mas não se esqueceram. Aquele time ficou estigmatizado como
um clube que não precisava temer a queda, pois sempre seria escorado por
muletas vergonhosas, porém poderosas.
Os anos passaram, a vergonha se
tornou história, tanto quanto vários troféus, tanto quanto vitórias
emblemáticas. Uma história eternamente manchada. Esse time passou ainda por
dificuldades é verdade, mas mesmo a duras penas manteve-se entre os grandes.
Ergueu-se, fazendo sucesso novamente. Era um sopro vigoroso na empoeirada sala
de troféus, um orgulho reconquistado, mesmo em meio à vergonha do passado
sempre relembrada.
O passado era mesmo uma página
colada no livro da última estante, na última prateleira, no lado mais escuro da
sala. Um lugar que ele não queria revisitar ou recontar. E quanta glória, para
deixar essa parte mais esquecida ainda: disputas de novos títulos vieram e
pouco tempo depois, grandes conquistas. Sim, ele podia se assentar entre os
grandes novamente, mesmo que timidamente, torcendo para que ninguém lembrasse
que ali ele não deveria estar.
Alguém disse uma vez: a vida é
como uma roda gigante, um dia você está em cima, outro em baixo. Aquele time
sabe bem o significado disso. De grande a assentado na terceira força, de
vigoroso conquistador de títulos, a usuário de tribunais para ganhar entre
engravatados o que não conquistou em campo. Depois de mais um título entre os
grandes, aquela sombra negativa parecia cada vez mais apagada, entretanto sua
cabine na Roda Gigante estava descendo novamente e com cores fortes retocou o
desfoque passado. O grande time seria mais uma vez convidado a descer um degrau
em sua glória, parecia o passado clamando pelo o que não foi cumprido.
O embate terminou em campo, com o
soar firme do apito. Ele cumpriria seu próximo ano entre a segunda força. As
piadinhas vinham, o time parecia conformado, disputaria finalmente com
dignidade aquilo que lhe cabia.
Surpreendentemente não apenas a
história da queda se repetia, a disputa em campo havia terminado, mas os
tribunais ignoraram o apito final. Dessa vez , ironicamente seguiram a regra
beneficiando mais uma vez o grande Time. Um time de menor expressão havia
escalado um jogador em situação irregular. Todos que podiam ter evitado esse
mal que converteu a macia bola de futebol em um duro martelo de madeira, nada
fizeram e o pequeno time perdeu os pontos ganhos em campo, para a sorte do
famoso time, esse pequeno tinha poucos pontos a mais do que ele, assim o famoso
pôde mais uma vez se salvar. Era o justo, embora pouco moral, era o que todos
sabiam que era certo, mas sentiam que estava errado.
No esporte, o que se decidiu em
campo perdeu o valor naquele dia. Aqueles que economizaram moeda por moeda para
assistir aos caros confrontos pagaram pelo que foi decido não diante de seus
olhos, mas numa fria sala de tribunal. A derradeira notícia chegou pelas páginas
de jornal.
A história do grande time estava
mais uma vez embebida na vergonha. Antes as quatro linhas eram suficiente para
escrever uma história de futebol, hoje ela precisa de páginas e páginas de
processos, ofícios... o grito apaixona do de ‘gol’ foi substituído por uma fala seca de ‘caso
encerrado’.
Epílogo
Foi um dia atípico onde o certo e
o imoral foram escritos com a mesma caneta. Alguns de nós sonhou com uma
decisão difícil, porém libertadora e corajosa que o grande Time poderia tomar:
Que ele se abstenha de ficar entre os grandes e aceite cair, que faça o
contrário de anos atrás quando tinha o dever de descer e não desceu, quando
devia subir um degrau e avançou arrogantemente dois. Por favor, diga para todos
ouvirem: temos o direito debaixo dos braços, mas um dever em nossas
consciências. Estaremos na segunda força.
Não será essa uma oportunidade do
destino de limpar uma história tão suja e empoeirada?
A oportunidade de continuar
grande, sem levantar troféus, mas antes e mais importante, levantando a cabeça.
Contextualização
O Fluminense Football Club foi rebaixado para a segunda divisão do campeonato nacional pela primeira vez em 1996, não disputou a serie B em 1997 em atitude arbitrária. Ainda assim foi novamente rebaixado para segunda divisão e no ano seguinte para a terceira. Disputou a terceira e venceu, portando deveria disputar a segunda divisão novamente, mas foi colocado na primeira divisão na criação da copa João Havelange em 2000, juntamente com outros times que também não tinham conseguindo o acesso pelo campo e bola como o Bahia e o Guarani.
Permaneceu na série A, ganhando inclusive 2 títulos depois disto. O primeiro em 2010 e o segundo em 2012. Em 2013 tornou-se o primeiro time campeão Brasileiro rebaixado no ano seguinte. Dada sua péssima campanha, ficando em décimo sétimo lugar num campeonato onde os quatro piores colocados são rebaixados para a série B.
A Associação Portuguesa de Desportos, time de menor expressão havia ficado com 48 pontos enquanto o rebaixado Fluminense com apenas 46. Após o término do campeonato nacional de 2013, houve a constatação que Portuguesa havia escalado o jogador Héverton de maneira irregular e por isso perdeu quatro pontos, ficando abaixo de Fluminense, sendo por sua vez rebaixado e livrando o popular time carioca da serie B de 2014 em decisão pelo Supremo Tribunal de Justiça Desportista - STJD, no dia 16 de dezembro de 2013.
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